27 de junho de 2012

Frowning


- Are you sure you want to do this?
- Oh, Harriet, stop this drama. It’s just a birthday letter. Letting me read it won’t kill us at all.
- Ok, fine, I’ll let you read it, but do it out loud. And don’t forget what I’ve told you before.
- What have you told me?
- *sigh*Honestly, Elise?
- It doesn’t matter. I’ll just start it, before you take your words back.
- Quick, please.
- “Dear Harriet,”
- Oh, here we go.
 - “It’s undeniably interesting how time runs slower or faster according to one’s point of view.
“You know, dear, reality is just a matter of perception – time and space perception, to be more specific. A person can, eventually, unwittingly pass through its entire life believing that living miserably and mediocrely is the undiscovered key to happiness (instead of trust and self-assurance, as The Eagles would say), and without noticing how subjected to circumstances out of its own power it is. And, of course, I don’t mean subjection to others’ power alone. I mean subjection to the undeniable and untouchable power of The Universe, supported (in its whole mean) by whatever stands behind it – I’d say ‘God’, which is true for me, but I must definitely respect your always valuable opinion; or opinions, we haven’t seen each other for a while and I’m not quite sure of what’s been in your mind. Or out of it.”
- And you wonder why I frown.
- Silence! “There’s a moment – a take-it-or-leave-it one, anyone would suppose – in which serious decisions should be taken, with no excuses allowed; it doesn’t matter how seriously committed with the truth one might be. It doesn’t matter how much love, passion, anger, or any other feeling, fulfills this one’s heart. Nothing can actually set us apart as ‘crucial moments free’, but there’s definitely something to set you apart from this misguided crowd of misguided mediocre existences; unfortunately, I haven’t really discerned what this ‘something’ is or means, once I had been looking for a general however specific and unique definition. Nonetheless, I have reached the conclusion that each useless person in this world can be a stood out – although that would be undeniably bewildering, once a crowd wholly stood out remains a crowd –, and standing out is something that can be done through one’s own individuality and special abilities, besides the help of one or one hundred more powerful people, and by powerful I mean ‘moneyful’. You may say how obvious this all sounds, but if so, there would be much more proper genius walking on this Earth and, provided I’m much of a proper genius, I am sure there aren’t many properly established around.” What?
- Keep going on, there is a moment in which everything makes sense.
- “You could wonder the reason why all those specially nearly delusional sentences were typed in the same letter, forced within the same context, running out of any sticky logic putting it together, such as sense, order, cohesion, etc. Well, dearest of them all, I have no other intention than to make you aware of how important, special and full of potentials you are. Nevertheless, don’t feel offended by me saying ‘full of potentials’. I have been watching your growth and encouraging your always mind-blowing intelligence for so long that I have lost account of time myself. And, once you’re turning 18, I believe it is the perfect time for your naturally outstanding person to turn those already bright potentials into consumed acts. Much more to-be-acts than I can actually count using nothing but my fingers and toes. If you’d prefer, I could consider my hair and arms as countable tools, but that wouldn’t be necessary whatsoever. There’s no need to count the stars, once you’re sure they’re so many they light up the sky from the brightest day to the darkest night.” This is so sweet, Harry.
- Keep reading it, Elise.
- “Year after year I send you, alongside a sweet vintage gift, one of these always long and senseless letters, even though filled with the best of kindness I can extract from myself, so I suppose the lack of sense and warmth must be getting into your mind as the most normal, sweet and full of logic stuff. If not so, please don’t let me know. There are few things which I would rather not be aware of. In general, they are considerably important things in my life and routine, so consider yourself as part of this select group hidden inside the closest to ‘heart’ I have ever had. Oh, and, of course, let me say ‘happy birthday to you’, Harriet. Being expelled from your grandmother’s uterus has never been quite of some happiness to me, but as I’ve already told you, you’re significantly significant for me to receive my cheering words for being around for 18 years after you own expel, but from my sister’s uterus, of course.”
“Keep up with the good work. You’re one of those rare life winners, which managed to be successful and happy altogether. Never lose that, or you’ll never recover your humanity – always see me as the best not-to-follow example of them all. And don’t forget that, although you have one of the most beautiful smiles I’ve ever seen, the most powerful one is hidden near your eyebrows.”
“Truly yours,”
“Your (may I dare say ‘beloved’?) Uncle S.
- *sigh* So, what do you think?
- I remembered what you said.
- Oh, really? That fast? *laugh* So, what was it?
- You said these letters were the reason why you’d always frown.
[Pause].
- Why do you frown, Harriet?
- Well, I would say I’m just smiling, but upside down.

[Composition for english class - C1 level]

24 de junho de 2012

Fulana


Fulana era uma garota esperta.
Estudante, estudiosa.
Sonhava com um futuro bom.
Trabalhava por seu futuro bom.
Fazia qualquer coisa.
Uma pena isso.
Todos os outros também queriam o próprio futuro bom.



[Mas não precisava causar a anulação do vestibular.]

20 de junho de 2012

Heterônimo

Três e meia da manhã. Ainda estava acordada.

Decidir começar aquele livro havia sido, de longe, minha ideia mais cansativa. Seis meses e trezentas páginas depois, ainda me sentia em um beco sem saída e percebia que, aos poucos, a bomba do branco acabaria explodindo em minhas mãos.
A essa altura, estava presa num mesmo capítulo. O 14º, dos 17 que pretendia escrever. E realmente não sabia como encerrá-lo. Perecia nessa dúvida havia oito noites. Minhas olheiras chegavam ao nariz, e eu poderia jurar que durante a madrugada ouvia gritos vindos da minha cafeteira, tão sobrecarregada e maltratada.
Cansada do processo, cansada. Cansada da minha família. Cansada dos meus amigos. Cansada daquele maldito livro. Cansada do computador. Desliguei tudo – nada havia a ser salvo, já que nada vinha sendo escrito. Afoguei meu rosto na água gelada que saía da torneira. Sentia uma ressaca literária das piores.
Vestindo um pijama e, calçando um par de sapatilhas, com um casaco e chaves de casa presas no sutiã, saí de casa. Em plena madrugada. Sozinha. Talvez minha mãe acordasse e entrasse em desespero. Talvez fosse melhor voltar e pegar meu carro. Mas quem se importaria com detalhes quando sua mente trabalha tão lentamente – já havia caminhado mais de onze quarteirões quando consegui alcançar esse raciocínio.
Depois de muito, muito andar, acabei sentada num banco de praça. Praça muito feia, por sinal. Mal cuidada, de dar vergonha. Dei uma risada interna. Não havia qualquer espelho, mas com certeza meus cabelos se pareciam com aquela grama que havia crescido demais e padecia bagunçada e embaraçada. Observei um cão desolado passando, enquanto eu me fazia perguntas inúteis. Ele, por sua vez, devia se perguntar o motivo de um cão ser obrigado a viver desabrigado, em uma noite fria como aquela, sem qualquer comida, mas não tenho certeza. Se eu soubesse ler mentes, creio que não seria muito mais feliz.
Pode ser incrível como podemos alcançar o fundo do poço usando diferentes caminhos. Eu com certeza não imaginava a miséria psicológica que me aguardava quando, feliz, decidi que amava metalinguagem. Uma decisão altamente normal, se não comum. Isso, claro, em situações que envolvem pessoas lúcidas, equilibradas e emocionalmente estáveis, cheias de uma “força interior”. Desnecessário acrescentar que nada disso amo/sou.
Metalinguagem deveria vir com um aviso, “pensar duas vezes antes de utilizar em autobiografia não declarada”. Porque foi esse o meu erro.
Modificar alguns nomes, personalidades e situações não tornava aquela história que escrevia menos minha. E, talvez, a grande questão de todas essas noites mal dormidas não seja “o que fazer dessa história?”, mas “o que fazer da minha vida?”. Vinte anos mal vividos, à sombra da covardia. Amando qualquer coisa que porventura me olhasse duas vezes. Reclamando de tudo aquilo que pudesse movimentar minha existência a um sentido mais verdadeiro. De alguma forma, eu acreditei que escrever sobre isso esclareceria o meu destino. Só que não.
Cansei de escrever sobre ser infeliz e procurar uma felicidade de papel maché.
Sempre acreditei que estava apenas pairando sobre o abismo, na segurança de uma nuvem permanentemente tempestiva que nunca choveria pra qualquer lugar. Mas foi apenas uma crença ingênua. O escuro do abismo já me iludia os olhos havia mais tempo que eu era capaz de conceber. E a chuva já me havia enchido e afogado, entre essas quatro paredes da alienação de mim mesma.
Coloquei as mãos nos bolsos do casaco. Minha cabeça doía, e minha garganta apertava a ânsia de chorar. Olhei para os lados, e não havia uma alma, sequer uma perigosa, pra me fazer companhia. Escutei ao longe a torre da igreja badalar seis da manhã. O frio não cessava, e fazia com que eu esboçasse caretas a cada rajada de vento que atravessava aquela praça. Suspirei. Sempre gostei de suspirar.
Panfletos baratos de lojas de esquina se acumulavam próximos aos meus pés. Fiz algum esforço para alcançar um, enquanto tentavam dançar ao sabor de uma brisa. No verso de seu papel sulfite verde, um vazio. Todo um vazio. Esperando para ser preenchido pelas palavras de um poeta ou contista idealista, ou pelos esboços de um ilustrador de cartazes desempregado. Talvez os rabiscos de um matemático professor mal remunerado, que sonhava ser laureado com um Nobel.
Tudo começava por um vazio.
Esvaziei minha mente. Ou pelo menos prefiro assim pensar, já que seria impossível, por um só segundo, cessar o movimento inconstante da minha cabeça ainda muito cansada e dolorida. Mesmo assim, parecia que nada poderia me tocar, naquele momento. Éramos eu e Deus apenas. Como se esvaziar-se fosse tal qual uma elevação espiritual.
Quando abri os olhos que não havia percebido fechar, uma senhora, muito simples, estava parada a alguns passos de distância. Carregava uma bolsa puída na alça, e tinha olhos gentilmente cansados. O Sol já brilhava intensamente, atravessando as árvores de copas irregulares e magrelas, parando sobre meu olhar. A luz fê-la perceber que eu também a observava, mesmo estando com a cabeça abaixada. Não se intimidou pela minha aparência estranha.
“Com licença, querida, você está perdida, ou fugida?”
Levantei a cabeça lentamente. Há três horas, ou três horas depois de ter saído de casa? Não saberia por onde começar a respondê-la, não fosse um insight que me surgiu, tão mais rápido do que me fugira uma ideia oito noites atrás.
“Encontrada”. Um ponto de interrogação passeou por seu rosto, antes de sorrir naturalmente e, após um leve aceno de cabeça, seguir seu caminho. Depois dela, vários outros passaram, falaram, viveram... Acabei cochilando lá pelas onze daquela manhã. Fui despertada às 18 horas, pela mesma senhora; repetiu-me a pergunta. Repeti-lhe a resposta.
Já anoitecia. Ofereceu-se para acompanhar-me até em casa. Recusei, mas depois me arrependi. Caminhei solitária por várias ruas de um caminho mal memorizado, até finalmente chegar ao meu lar. O carro de polícia parado do lado de fora me deu vislumbre do que teria que enfrentar quando entrasse, mas não importava. Não agora. Finalmente terminaria aquele livro. E em paz.

7 de junho de 2012

Cough Syrup


“If I could find a way to see this straight, I’d run away to some fortune that I should have found by now…”

Era um pátio enorme. Enorme, e muito cheio. Cheio de adolescentes idiotas se amontoando às beiradas dos pseudopopulares, dando risadas forçadas pra chamar atenção ou procurando os lugares estratégicos pra ver melhor uma gatinha bunduda. Todos se sentindo tão adultos, tão poderosos.

E lá nós duas.

Sempre havia sido nós duas. Isaura e eu. Sentadas em um canto pouco importante daquela grama bem cuidada. Ela tocava uma música qualquer em seu violão. Nunca soube pra quê exatamente ela o carregava pra todo lugar. Ninguém se importava. Nem mesmo eu, sua única amiga, me importava. Não conhecia a canção que ela tocava naquele momento.

Havia silêncio em nossos lábios, todos os dias, há muito tempo. Jamais entendi exatamente de onde surgira nossa amizade. Às vezes parecia que, num dia, nos sentamos uma próxima à outra, e simplesmente nos acostumamos a estar assim. Tantos anos e acho que nunca soube seu nome completo. Mas ainda assim, não precisávamos disso. Era essa a beleza subliminar da coisa.

- Porque esses óculos escuros, Isaura? – Vinha querendo perguntar havia alguns minutos daquele recreio. Fingia observar o céu para manter a aparência de que não me importava.

- Olhos injetados, Diana. – Esboçou uma careta sob aquele aviador espelhado, que lhe deixava com uma aparência sobremaneira bizarra, enquanto tocava uma sequência que parecia especialmente difícil. 

- Está fumando de novo? – Algumas coisas eram impossíveis de ignorar.

Encerrou a música antes de me responder. Começava a achar que conhecia aqueles acordes.

- Não sei se meu nome foi uma ironia ou uma intenção. Parecia que minha mãe sabia que iria morrer. Que iria me deixar sozinha. – Ficou com a cabeça parada por um momento, aparentando fitar o vazio. Voltou-se novamente para seu violão.

No fundo, eu sentia vontade de dizer alguma coisa, mas eu não sabia o quê. Não sabia como. Não sabia racionalizar esse sentimento.

- Não seja ridícula. Ter o nome de uma personagem que vive uma desgraça não quer dizer que você vai viver uma desgraça.

- Vem me dizer que você nunca teve um medo especial de acidentes de carro.

Fiquei calada por um momento. Ser vítima da idolatria da minha avó não me tornaria obrigatoriamente vítima da minha própria vida. Não sem que eu pudesse interferir.

- Você não respondeu minha pergunta. Está fumando de novo, Isaura?

- Estou. – Falava com tamanha calma, incomum. – E sabe, dessa vez não pretendo parar.

- Seguindo sua lógica eu deveria ser muito mais infeliz. Lady Di morre no final. Isaura se dá bem.

- Isaura é ficção, Diana. Isaura é ficção.

Recomeçou a tocar o violão. Era a mesma canção anterior.

- Parece que conheço essa música. Mas não me lembro muito bem dela.

- “Cough Syrup”. – Ela respondeu, num pigarro muito rouco.

- Ah, sim. Bonita, mas triste. Muito triste.

Ficamos em silêncio por mais tempo, em meio à canção e à gritaria do intervalo. Então, finalmente, o sinal soou. Levantei-me num pulo.

- Vem, Isaura. Que essa vida é difícil demais pra ficar vendo a banda passar – Estiquei braço e ofereci-lhe ajuda para se levantar; ela já havia parado de tocar.

- Nós não devíamos usar óculos se não fosse para vermos as coisas de forma diferente. – Minha amiga mal se movia. 

- Isaura, a Marilia já está indo pra sala. Você sabe que ela não aceita que ninguém entre depois do segundo sinal. – Balancei a mão estendida para chamar sua atenção.

- Eu estou ficando cega, Diana.

...

Nenhuma frieza no mundo teria me preparado para escutar aquilo.

...

Sentei-me novamente ao seu lado, naquela grama. Sem se importar com faltas na aula de Matemática ou se a coordenadora apareceria gritando a qualquer momento, ela retomou sua canção, tocando pelo resto de luz que seus olhos absorviam.

“… I’m waiting for this cough syrup to come down, come down”